Dor Que Nos Persegue

paulohenrique

No último texto que escrevi – “Detalhes de Um Corpo Doente” – fiquei pensativo quanto ao que meus leitores achariam, ou mesmo questionariam sobre essa nossa “fragilidade”. Não que seja extrema, ou que a qualquer momento o vento nos quebre, nada disso, mas o que na verdade escrevi naquele texto é bem superficial. Existe muito mais detalhes que acredito que qualquer pessoa que atingida pela Pólio, por mais sutil que seja, tem um grande entendimento do que ali escrevi.

Quero ao menos deixar aqui que, mesmo diante dessa situação que nos leva a temer a dor, eu e a Eliana temos muitas condições de fazer coisas incríveis.

Uma vez, não me recordo o ano, fomos convidado a passar um dia na casa de um grande amigo nosso. Amigo esse que, apesar da distância e do tempo, ainda permanece em nossos corações, é uma grande pessoa e a ele dedico todo meu amor e carinho.

Naquela época, eu tinha uma certa liberdade, como eu detalhei no texto anterior, eu tinha condição de ser sentado no banco da frente de um carro e, assim, quando essas chances surgiam, eu pegava meu aparelhinho de música, colocava o fone de ouvido e ficava encantado com tudo que passava ao meu redor, ao som alto de Enigma.

Então, acredito que era um sábado ou domingo em uma casa grande com piscina. Estávamos todos lá nos divertindo e, quando chegou a hora de experimentarmos a piscina, foi algo de extrema atenção.

Não vou dizer que seja a primeira vez que eu e a Eliana entramos na água, aliás, a praia para mim, foi um marco em minha vida, a qual, quando abriram a porta do carro que eu estava, fiquei extremamente surpreso com o som do mar invadindo meus ouvidos.

Mas, eu estava falando de uma piscina, e a primeira pessoa que foi colocada para entrar na água foi a Eliana, e para ela foi mais que tranquilo. Eu confesso que em minha cadeira de rodas eu estava com certo medo. Sei lá se as pessoas iriam me segurar direito, se sem querer bateriam o meu pé enquanto estivessem me descendo, ou mesmo, de traqueia aberta, se meus pulmões se encheriam de água.

Foi algo agradável, mas não consegui me relaxar na água. Para mim, ela estava fria e eu não conseguia controlar os meus tremores, e assim, o que mais eu ouvia daqueles que estavam ao meu redor, é quando diziam para que eu ficasse tranquilo. Complicado isso, mas foi divertido.

Das vezes que eu e a Eliana fomos à praia, somente uma vez aproveitei de verdade a água do mar. Estava um dia muito lindo, a praia quase vazia e quando a onda vinha, ela estava deliciosamente quente e muito gostosa. Pedi que me colocasse um pouco mais ao fundo, pois eu queria sentir meu corpo todo banhado. É poderoso o oceano.

Eu não me recordo quem estava comigo, mas lembro que a pessoa apoiou minha cabeça entre suas pernas para que, assim, quando a onda vinha, não chegasse em minha traqueia. Esse momento tão maravilhoso é inesquecível, mas, como eu disse, foi a única vez que eu realmente senti o mar em mim, as outras vezes foram as mais cautelosas possíveis e uma delas foi uma chuva tão grande, que mesmo na areia, o que fiz para curtir aquele banho frio foi jogar uma partida de xadrez com um grande amigo chamado Leonardo. Um dia muito especial para mim. Até perdi uma peça desse jogo maravilhoso, e hoje penso que em algum lugar desse nosso lindo planet, essa peça se encontra, como prova de minha existência, como prova de minha conquista.

Bem, voltando aos dias de hoje, os quais mais difíceis se tornam, infelizmente devido ao meu descontrole emocional e por assim dizer decidir abandonar algo que se hoje ainda estivesse vivo em mim, talvez aqui eu não estaria, quer dizer, é apenas uma teoria pois eu tinha uma certa liberdade, passeava praticamente a semana toda e muitas dessas vezes foram fora do hospital.

Foram praticamente dez anos certinhos, de 1996 até 2006, quando nos finais de semana eu ligava para meus amigos bem cedo, logicamente os acordando, para ver a oportunidade de ser levado ao cinema, ou mesmo ir ao shoppings ou garimpar nas galerias que havia na Av. Paulista.

Mas estes foram momentos marcantes e hoje tornam-se distantes. Infelizmente, tornei-me um fracassado naquilo que de certa maneira eu desejava, era um sonho quase inalcançável e quando tive em minhas mãos, eu simplesmente larguei.

Mas, hoje estou aqui, mesmo diante das grandes dificuldades que me cercam, eu procuro viver o meu melhor e guardo momentos maravilhosos, e quero um dia poder vivê-los novamente.

Vocês sabem, textos passados meus eu declaro ter um grande sonho, talvez distante, mas que um dia irei realizá-lo. Que Nova York me espere e que a Times Square esteja tão linda como sempre foi, quando aos meus olhos eu for testemunha viva de um momento único em minha vida.

Poder contemplar grandes arranha-céus e outdoors hipnotizantes de uma megalópole que amo de paixão.

Enquanto não alcanço esse momento especial, vou lutando, conquistando e a todos amando com grande paixão, pois, na atenção que meu corpo exige, caminhos de pés descalços em um solo duro mas que por mais que a dor seja presente, olhando para frente, eu sigo, sem olhar para trás, para que assim, quando ao final do caminho eu chegar, serei coroado como prova de minha grande força e vontade de viver.