O Labirinto de Minha Vida

paulohenrique

Os anos de 1980, até o início da década de 90, foram momentos que mais se fazem presentes em minha memória, onde a saudades se expressa com muita emoção em cada instante.

Eu ficava em um grande quarto, que era um salão, por assim dizer, na companhia de meus seis amigos, ou mesmo irmãos por estarmos unidos por tantos anos. Justamente esse pedaço de meu saudoso momento foi o marco para eu começar a entender o que vem a ser a vida, recheada de uma rebeldia sem controle. As raivas eram presentes, os choros eram constantes e entre nós, os dois mais velhos, eu e a Tânia, disputávamos quem seria o líder do “Clube dos Sete”. Em voz alta, comentávamos ideias, conversas e canções, até que duramente fui chamado atenção do por que tenho que falar tão alto. Hoje, aprendi, e no controle de minhas ânsias, procuro dedicar minha cordialidade, da melhor maneira possível.

Haviam dois televisores nesse grande quarto, uma TV grande bunduda, ainda à válvula, que ficava ao lado das meninas, e uma menor, branca de 14 polegadas, que ficava bem no meio de uma parede grande do meu lado esquerdo, e para mim era muito difícil enxergar o que se passava nela. Por conta disso, adquiri uma mania que muitos no início detestavam, ainda mais as atendentes de enfermagem. Minha cama ficava encostada em uma janela. Eu não gostava daquele canto, e sempre que eu podia, com minhas mãos tentava baixar a persiana da janela que ficava atrás de mim, e assim, me sentia mais protegido e seguro. Na hora de ver TV, eu pedia que puxassem minha cama mais para frente, para poder assistir os meus programas favoritos.

Algumas atendentes achavam ridículo eu ficar fora da posição do quarto, mas eu não conseguia ver direito os desenhos que eu tanto gostava, ou mesmo MacGyver em Profissão Perigo. Eu amava assistir as séries que passavam após a Sessão da Tarde, as quais me davam grande alegria. Quando começavam as novelas, eu detestava, fazendo com que eu procurasse por atrações melhores em outros canais.

Naquela época, eu não gostava de estudar, eu não queria fazer coisas que eu não tivesse prazer, mas foram os estudos que me guiaram as responsabilidades.

Eu não gostava de ler livros e sempre naquele momento eu ficava envolvido imensamente em gibis que formavam pilhas embaixo de meu travesseiro.

Eu estava em busca de algo que me desse satisfação e quando encontrava alguma coisa que me atraia a atenção, largava tudo com muita facilidade, dando todo crédito àquilo recém descoberto. Porém, lembro claramente que, aos 14 anos, mesmo perto da janela que eu tanto detestava, li um livro. Uma leitura que me tocou, mas a cada página lida, eu parava e ficava atento a tudo ao meu redor. Com a persiana da janela aberta, eu me desafiava, olhando atentamente o escuro de um céu noturno, buscando ver quem me observava, e quando nada encontrava, eu voltava minha atenção ao livro que eu estava lendo. Assim, li por completo “O Exorcista” que no livro, era a história de um garoto possuído.

Eu lia bem, não era fã de ver uma página inteira cheia de letrinhas, porém, eu me esforçava para ler. Um livro durava meses, e até hoje é assim, mas com grande paixão pela leitura.

Como no início desse texto, estes anos passados da década de 1980 se mostram tão presentes que a sensação que fica é que apenas se passaram dias, mas, as horas foram imensas as quais nem sei dizer quantos bilhares de segundos deram seu adeus.

Tínhamos também, visitas frequentes dos evangélicos que contavam e cantavam histórias bíblicas, nos mostrando painéis de papelão com personagens característicos do antigo Egito. Não tenho certeza, mas nesses anos distantes li sim a Bíblia Sagrada, mais de uma vez.

As frequentes visitas evangélicas foram marcadas por pessoas que hoje, algumas não estão mais presentes, mas acredito que muitas estejam ainda vivas. Pastor Marcos, Mirian, Tia Junia, Eleny e muitos outros foram grandes responsáveis por nos ensinar sobre o verdadeiro amor de Cristo e, assim, hoje me deixam saudades de momentos cheios de muito amor.

Naquela época, os médicos nos faziam companhia. Sim, eles estavam mais presentes, e quando em um plantão tranquilo ficavam nos divertindo com jogos de tabuleiro. Era muito gostoso aquele momento que nos dava grande alegria.

Quando o Dr. Saraiva nos apresentou o computador, eu e o Pedro pensávamos como ele poderia nos deixar conhecer aquele equipamento. Houve um dia que cheguei a pedir a ele que deixássemos usar seu TK-2000, e assim ele disse que confiaria em nós dois, mas que assim que ele não estivesse usando, poderíamos tentar ver o que seríamos capazes de fazer. Isso nunca aconteceu, e assim, continuamos a nos divertir com o Phantom System que tínhamos.

Dr. Saraiva era como um pai, um excelente profissional que dedicou seu completo amor ao próximo na especialidade de nos prover melhor condição de vida, criando aparelhos de respiração artificial. Para nós sete, ele era como um personagem da Disney, que a cada dia, tinha uma grande ideia, e as colocava em prática. Professor Pardal, era assim que carinhosamente o chamávamos. Ele se preocupava muito com a gente. Ele era católico, tinha uma grande fé, e um dia reuniu-se com outros médicos e todos eles nos deram uma Bíblia Sagrada. Mesmo com seu imenso amor, Dr. Saraiva era rígido. Era uma época que não tínhamos nenhum apoio financeiro, sendo assim, eu principalmente, sempre quando queria algo, buscava nas pessoas que sempre estavam com a gente, médicos e enfermeiras, algum dinheiro para poder comprar algo desejado.

Queríamos tomar sorvete e cheguei no Dr. Saraiva e pedi que ele nos desse algum dinheiro… não me lembro ao certo qual o valor que pedi. Ele perguntou o que faríamos com o dinheiro e quando falamos que era para comprar sorvete, ele seriamente disse que jamais daria algo que nos engordasse. Assim, passamos o dia sem o sorvete tão desejado.

À tarde, eu sempre torcia para que a professora não viesse e assim eu poderia jogar videogame com o Pedro, e quando dava certo, a alegria nos contemplava com grande satisfação de podermos estar envolvidos no mundo de Super Mario Bros 3.

Durante um bom tempo, nessa época, eu e o Pedro tínhamos um jogo que mais nos dominava. Juntos ficávamos atirando em objetos que apareciam na tela, sendo que no jogo éramos dois personagens, um azul outro vermelho que tinham propulsores nas costas e armas em suas mãos. Dava para ir em qualquer direção na tela, para cima ou para baixo, esquerda e direita, tínhamos que desviar de naves que apareciam, ou tiros dados por canhões nos prédios que surgiam para não sermos atingidos, e com nossas armas, tínhamos que destruir estes objetos ameaçadores e completar as fases do jogo. Foi um cartucho japonês dado por um padre que vinha nos ver, era um cartucho cor de rosa e na etiqueta estava o título Final Mission.

Heavy Barrel era outro grande e maravilhoso jogo com o qual eu e o Pedro nos deliciávamos ao atirar em inimigos que vinham de todos os lados. Era um desafio realmente difícil, mas viciante. Com o Phantom System tivemos muitos jogos que hoje me deixam uma imensa saudade.

Hoje, confesso que o labirinto de minha vida cresceu de tal maneira que não tenho ideia de sua extensão. Durante minhas caminhadas, chorei, gritei, sofri e sorri. A alegria é como uma gota de chuva que cai em um gramado, ela penetra na terra e é absorvida pela vida. Nesse momento, um sorriso desponta em minha face, em busca desses momentos lindos que vivi e que desejo muito compartilhar com aqueles que a mim dedicam sua atenção.