Pequenas lembranças

Folha

O tempo nublado como este reflete um passado que foi somente meu.

Quando a luz do sol não passa pela grossa camada de nuvens, vem um momento ausente que um dia deixou saudades.

Era um quarto grande, iluminado apenas com a luz do centro, permitindo que de cada lado houvesse ausência de sua presença, de forma que ainda podia se ver tudo ao seu redor. Em meio a esse tempo escuro, o silêncio é sua companhia; nada mais do que justo se divertir com algo que lhe permita um pouco mais de alegria.

Sinto saudades desses dias em que, sob céu cinza, ficava deitado em minha cama no mundo de Super Mario ou Zelda. Claramente a visão que passa em minha frente é poder estar jogando The Legend of The Mystical Ninja, um cartucho alugado por um padre muito amado e querido.

Não queria estar em minha realidade, em que apenas observar o tempo, em meio à quietude e à solidão, dava margem a um marasmo sem fim. Eu queria sim, lutar contra inimigos, pular obstáculos ou combater com espada em busca de minha vitória.

Para muitos, pode ser um desperdício de vida, mas, para mim, era tudo que queria naquele instante, meu mundo, meu universo.

Em tempos assim, me vejo jogando “Duelo de Águias”, um jogo com apenas dois livros, em que um ficava comigo e o outro com meu amiguinho Pedro. Juntos, passávamos horas na caçada aérea, um contra o outro em aviões da Primeira Guerra Mundial.

Em tempos assim vêm as saudades da alegria que era fácil encontrar e de se contentar com pouco –e mesmo aquele pouco era como o presente mais caro que pudesse ganhar.

Saudades de certa inocência, em que o coração não era contaminado por dúvidas cruéis, onde desejos além de meu alcance não eram tão presentes como têm sido ultimamente. Não acredito na impossibilidade, mas sou humano e, assim como o tempo, às vezes não permito que o sol ilumine meu céu, –permito apenas que as estrelas, de suas inatingíveis distâncias, deixem seus rastros de luz que aquecem minha alma em momentos de solidão.

São estranhas as nossas vidas, em que, em meio a muitos, nos sentimos únicos. Seria como uma minúscula pedra de sal se misturar ao mar. Mas fica o desejar de encontrar alguém que ao menos olhe para você e, naquele instante, pega em sua mão e a troca de calor –é o que nos conforta, nos desperta, e o sorriso nasce em nossas faces.

Mesmo assim, vale muito a pena viver, sim, muito, pois, a cada dia, embora acordamos sem ao menos termos noção do que fazer de um novo dia, há sempre a oportunidade de ir em novas conquistas.

Em um dia, muitas surpresas surgem, grande parte  delas nos assusta, pois fogem aos nossos planos. Basta, então, improvisarmos tudo aquilo que almejamos e seguir em frente, sem nos deixar nos abater quando estamos ameaçados. Ameaças essas que atingem nossa alma, nossa mente e que sempre acaba por nos derrotar.

Hoje estou bem, alegre, mas não feliz. Mas amanhã pode ser que a felicidade venha e fique um pouco ao meu lado, o suficiente para que, quando ela se ausentar, eu tenha a certeza de seu retorno. E que, assim, possa continuar levando para bem longe as espessas nuvens que cobrem o meu céu, para que eu seja abraçado pelo sol, revigorando minha alma, nas lutas de cada dia que há por vir.