Viver é melhor que sobreviver
Existem dois filmes, ambos de anos e diretores diferentes, que me chamam muito a atenção. Não sei se caberiam como filmes cult mas, para mim, expressam o início de nossa “sobrevivência”.
Em 2009, após indicação de um grande amigo que, infelizmente, tirou sua própria vida, assisti ao primeiro desses dois filmes: “A Estrada”, com Viggo Mortensen, ou se preferirem, mais conhecido como o Aragorn, de “O Senhor dos Anéis”.
O segundo filme, “O Livro de Eli”, de 2010, com Denzel Washington.
Vez por outra, assisto a esses dois filmes, na sequência em que foram produzidos. Aos interessados que quiserem assistir, peço por favor que sigam essa sequência, pois trata-se do mesmo interesse: mostrar como seríamos após o apocalipse.
No primeiro, nos permite ver o finalzinho desse mundo que conhecemos, e passamos a nos ver na luta de um pai, que tenta a todo custo dar esperança ao seu filho, em meio ao nada, tudo cinza, sem vida e sem amor.
No outro filme, já não há o mundo no qual vivemos. O filme começa com o fim trágico de um gato que, milagrosamente, sobreviveu às explosões de imensas MOABs* (arma de destruição em massa não-nuclear). No cenário, há somente restos, poeira e a cor cinza. Eli, que esconde um segredo, sobrevive em meio às ameaças de uma gangue, que tentam de todas as maneiras roubar o que ele tanto protege.
Ambos os filmes trazem um ar de depressão. Não há o que fazer ali, em um mundo em que devemos tentar tudo novamente e que, de tudo que destruímos, não há retorno. Sabemos muito bem que os filmes beiram a ficção, mas temos consciência de que, se a própria natureza não agir em seu tempo indeterminado, nós mesmos nos destruiremos de forma bem pior do que o mostrado nas telas.
É interessante que muitos de nós hoje temos uma vida praticamente de sobrevivência. Seja financeiramente, pois a condição que a pessoa está lhe acomete a fome; seja social, pois dependendo de seus atos, a sociedade lhe aplica injúrias; seja pessoal, pois nos traumas a sociedade lhe oferece extremo medo.
Apesar de morar em um hospital e ser extremamente bem cuidado fisicamente, não digo que eu tenha uma vida de sobrevivência mas existem, sim, medo, ansiedade e muitas vezes desespero.
São poucos os que me veem como um ser humano. Digo ser humano no sentido humano mesmo, onde me encontro em meio às dúvidas, a um labirinto de emoções, que quase sempre me deixa perdido.
Como qualquer outro, também sou igual. Pode parecer piegas, mas há sim, em um corpo inerte, os mesmos sentimentos e desejos nutridos da vida de qualquer um. Nesse caso, não me refiro a mim, pois tenho meus poucos movimentos. Mesmo assim, minha mente e coração estão além da velocidade da luz, quando não há limite para sonhar.
Assim, a sobrevivência passa a ser apenas uma luz intensa que ilumina grande parte de meu caminhar. Acompanhado dessa clareza, há sempre o instante em que, dominado pelo medo, me enclausuro internamente. Como um animal acuado, observando a tudo e a todos, procuro sempre estar atento, para não libertar, de repente, um grande urso faminto que, geralmente, acaba por causar alguma destruição.
* Acrônimo de Massive Ordnance Air Blast, popularmente conhecida como “Mother of All Bombs”