Janelas

paulohenrique

Tentando fazer um trabalho no After Effects, comecei de repente a lembrar de uma música. Tentei cantá-la, porém bem mal, balbuciando alguma melodia digna de um cão em agonia.

Perguntei para a Eliana se ela conhecia aquela música, o que a surpreende. Ela diz que não, e sendo assim, acessei o YouTube e fui atrás do tema de um programa que existe até hoje na Rede Globo, mas que não assisto faz tempo: o “Esporte Espetacular”. Em minhas décadas de criança e de juventude, o tema de abertura ficou gravado na minha cabeça.

Fui em busca de informações sobre aquela canção, que só de ouvir já se imagina que fosse datada do século passado, talvez final dos anos 1960 ou meados dos 1970.

Entre os comentários que li, há uma referência sobre uma banda musical, The Carnaby Street Pop Orchestra and Choir que, em 1969, lançou seu único álbum, “The London Theme”.

Sabe? Passei tanto tempo aqui, e não é apenas tempo, mas emoções que, por vezes, não há como definir e depois tentar dar um gostinho de como foram.

Quando criança, geralmente ouvia essa música no sábado. Na época, era muito chato. O final de semana ofertava um marasmo sufocante, não tendo outra opção a não ser ficar vendo TV –e um programa pouco interessante. Na verdade, o que eu mais queria era estar na cadeira de rodas, explorando os corredores do prédio em busca de aventura.

Que aventura eu tinha dentro de um hospital? Bem, qualquer criança cria o que ela quiser em seu mundo de infância, desde que haja interesse, desejo de descoberta. Até um ambiente de enfermidade, sim, torna-se um paraíso para a imaginação.

Tudo o que um dia fui, hoje, encontra-se apenas nas profundezas da mente, que sempre age quando algum som, perfume ou mesmo a luz do Sol refletida nas paredes do quarto me trazem momentos de nostalgia.

JANELAS FOSCAS

Por falar em Sol, bem, as janelas daqui não são transparentes, mas foscas. Dá apenas para saber a cor do céu, em tons suaves entre branco, azul e cinza.

Neste ano, completarei 48 anos. Mesmo nessa idade que já sinto avançada, confesso que tenho medo de janelas. O fato de elas não serem transparentes me dá um grande alívio.

Lembro-me uma vez, quando criança, acho que era um sábado, o céu estava lindo, o Sol majestoso iluminava o prédio vizinho. Quase sentado em minha cama, dava para ver a rua, mas bem pouco, e pessoas jamais conhecidas transitavam.

Naquela época, eu não sabia ler, porém ficava olhando os quadrinhos de um gibi da Disney. Quando não estava mais interessado, passava a detalhar o meu quarto e o silêncio que me acompanhava. A porta sempre ficava aberta, o que despertava em mim um desejo de alguém passar para ter a certeza de que não estava sozinho. Mas ninguém passava. Vezes e outras, ouvia-se o choro de um bebê ou os passos de alguém que trabalhava no local. Mas eu, eu ficava ali, sem poder sair, deitado em minha cama.

Ao final da tarde, algo me incomodava. Já não tinha mais interesse em nenhum gibi. Começa a se tornar uma tortura ficar olhando para a janela, onde o céu começava a escurecer, e desejar ver alguém passando em frente à porta do meu quarto. De repente, passa alguém e chamo pela “tia”.

– Tia, fecha a janela? – Sem saber a grande importância de dizer “Por favor”, me imagino hoje fazendo a feição de piedade do Gato de Botas do filme “Shrek”.

– Está calor, deixa assim. – Uma resposta seca que me deixa tenso, na esperança de a qualquer momento passar uma “tia legal”.

Já no escuro, iluminado por uma lâmpada que deixava o quarto amarelo, sentia-me entregue ao desespero. De repente, passa outra “tia”. Quando peço para que feche a janela e a persiana, ela o faz com toda a sua bondade.

Ufa, que alívio! Vou poder dormir bem…